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Labi lasīt

quinta-feira, 9 de julho de 2015

Questão de prioridades

Há algum tempo andei por refletir mais profundamente sobre as prioridades que dominam o homem. Isso mesmo. Não é o homem que possui prioridades, mas sim são essas quem possuem o homem e, por conseguinte determinam suas ações em sociedade. Sendo assim, penso que esse grande embate entre direita e esquerda, capitalismo e socialismo/comunismo, não passa de uma grande questão de prioridades.
Um caso que demonstra a questão da prioridade ou, no mínimo, levanta essa para reflexão é uma comparação existente entre uma capa da revista Veja de 1998 e uma Isto É de 2015. Não estou aqui a fazer críticas às revistas, apesar de haver muitas a serem feitas. O foco continua sendo a questão de prioridades.  A primeira capa anuncia uma crise destacando a miséria como o “grande desafio do Brasil”, seguido da seguinte frase: “a pobreza extrema de 23 milhões de brasileiros é uma tragédia que não pode mais ser ignorada”. A meu ver, nos últimos quatorze anos, a pobreza extrema não foi ignorada, tanto que os números podem nos mostrar o salto qualitativo que houve referente a fome e a essa pobreza no nosso país.
Como todos sabem, é um período que coincido com o governo PT. Não estou defendendo o PT, para deixar claro aos mais radicais que possam a vir me criticar por pensar isso, mas é inegável suas ações referentes ao conceito de ascensão social. Levando em consideração a questão de prioridades, e que a miséria não poderia mais ser ignorada, creio que o PT foi a melhor escolha desde o governo Lula até o momento. Novamente ressalto que não estou defendendo e apoiando as ações atuais do governo, pois me decepcionei muito mais do que pensei que poderia.
Continuando com a comparação, temos a capa da Isto É de 2015 apresentando o seguinte título: O Sufoco da Classe Média, seguido pelos supostos problemas que essa enfrenta: “escola, supermercado, gasolina e refeição fora de casa”. Refeição fora de casa! “Credo que desgosto do Brasil”, diriam os críticos mais reacionários (supondo que atingissem esse grau de sutileza). Novamente devemos nos orientar pela questão de prioridades ao pensar se estamos avançando ou retrocedendo. Há quem diga que prefere poder ter um vídeo-game de ultima geração, ou um carro do ano a haver alternativas ao problema da fome e da miséria que atinge, ainda, muitas pessoas. Nada contra os vídeo-games, pois quem me conhece sabe que gosto muito, mas eu, sinceramente, prefiro não ter entretenimentos do tipo, se a custo disso mais pessoas estarão dormindo sob um teto com alimento em suas mesas. É questão de saber o que é prioritário para uma nação; para a humanidade.
Há quem diga que Cuba é um país pobre. Questão de prioridade, novamente. Uma nação com a educação reconhecida recentemente como uma das melhores do mundo pelo Banco Mundial não me soa como pobre. Uma educação que não é pautada no lucro compulsório e sim num senso comunitário, transcendendo a lógica do mercado me parece bem evoluída. Um exemplo de que Cuba não é o que muitos insistem em pregar, é a medicina, que não é conhecida apenas pela qualidade, mas pela amplitude de cobertura, agindo numa lógica de medicina preventiva e com atendimento familiar. Mesmo após a “exportação” de mais de 30 mil médicos para 69 países, Cuba conta com uma média de 67,2 médicos para cada 10 mil habitantes, a melhor média do mundo. O mais interessante é que desde cedo os médicos cubanos são ensinados que sua missão é salvar vidas e não vender serviços. São sempre os primeiros a oferecer ajuda a outros países frente a catástrofes (inclusive aos EUA, no caso do furacão Katrina. Esses não aceitaram a ajuda) e epidemias (recentemente contra o vírus do Ebola).
Outro ponto interessante a destacar é a mortalidade infantil, que em 1990 era de 11 a cada mil; em 2000 caiu para 6 por mil. Hoje é de menos de 5 por mil, “ostentando” uma média melhor do que os Estados Unidos segundo a ONU e muito melhor do que a média da América Latina. Nação pobre? Não. Questão de prioridades.
É comum no Brasil ouvir críticas a situação atual da saúde e da educação, visto que são pontos importantíssimos para uma sociedade e parâmetros fundamentais para medir a o desenvolvimento e emancipação de uma nação. No entanto não há e nunca houve espaços para uma lógica diferente senão a lógica do mercado, do lucro e da concorrência. Quando Jango tentou sugerir que o país trilhasse um caminho pautado em justiça social e numa sociedade organizada de forma mais igualitária e racional, os militares tomaram conta (e o golpe não foi apenas de dentro). Sabemos o que representou esse período para a democracia e para a soberania do povo.
Com isso, apenas quero dizer que o senso comunitário das pessoas está desgastado ou nem existe, e que se não substituirmos essa cultura mercantilista que permeia o âmbito da educação, da saúde, e até mesmo da economia, estaremos a andar pelo caminho errado. Professor não vende educação; seus alunos não são clientes, são sujeitos que devem ser educados com uma responsabilidade social, aptos ao trabalho e a cidadania, tal como consta na lei. Médicos e enfermeiras não vendem saúde e serviços médicos. Seguindo a ideia de David Marquand, ao forçar esse tipo de relação na direção da lógica neoliberal, como se tudo fosse um grande comércio, acabamos por degradar as instituições responsáveis pela cidadania. A ética se esvai e só conseguimos pensar na lógica do dinheiro.

O que eu quero dizer é que tudo é questão de prioridade, e isso, meu amigo, lá no fundo pode definir seu caráter, queira ou não.







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Que seja produtivo! Maldito! hahaha